Esta semana iniciou-se um novo desafio – Terapia Familiar. Assim dito, sem contextualizar, até dá uma certa graça. Recordo-me de um episódio em que os meus pais me levaram ao consultório de um destes especialistas e de eu, uma jovem muito rebelde, ter-me escarrapachado no sofá porque tinha visto aquilo nos filmes americanos. Foi uma hora em que gozei literalmente com o prato: respostas evasivas e sem nexo, riso pateta e despropositado, atitude indomável e efusiva. O terapeuta pensou definitivamente que eu tinha uma perturbação qualquer e os meus pais saíram de lá tão envergonhados que ainda hoje me falam desse dia. Quando me recordo deste e de outros episódios menos ortodoxos da minha juventude acho curioso este caminho que agora se abre. Será que, enquanto profissional, também me irá acontecer o mesmo? Entrar-me-á pelo consultório um jovem rebelde com modos irreverentes? E como será a minha reação?
Amor será a resposta. Talvez porque já estive nesse lugar. Nesse lugar em que o comportamento – mesmo o pior que possam imaginar – não espelha o que nos vai na alma. Pelo contrário. O comportamento só diz uma coisa: preciso que me vejas, que me ouças, que me orientes, que me guies, que me reconheças, que me respeites, que me ames!
O meu filho mais velho tem 11 anos e está a entrar na adolescência. Os seus comportamentos às vezes já conseguem fazer-me tremer por dentro. Mas, em vez de ficar fora de mim, respiro. Respiro e recordo a minha adolescente.
Aquela jovem que queria ser livre.
Irreverente e inconsequente. A favor de tudo o que fosse politicamente incorreto. Gostava de chocar e de abanar. A sua presença era extasiante: corpo destravado, gestos tentaculares, voz altifalante, … A sua energia metia toda a gente a andar. Depressa e com atitude! Tudo o que fosse bonitinho, fofinho, queridinho provocava-lhe tremeliques e arrepios. A sua missão era literalmente despentear, mas despentear até ficar com nós nos cabelos, daqueles mesmo mesmo muito complicados de soltar. O imprevisto desnorteado seduzia-lhe. Viviam todos cheios de sorrisinhos, sonhos cor-de-rosa, biquínis amarelos e lacinhos com bolinhas. Tudo isto tirava-lhe do sério e, mais, era pouco: limitava-lhe! O Mundo não podia ser isto, não, não, não, tinha que ser muito mais!
À primeira vista os adjetivos mais fáceis de a definir seriam: destravada, louca, despassarada, desorganizada, desatenta, elétrica,…. Mas no fundo deste iceberg existia mais, muito mais. Existia um ser (vá coragem!) – muito lamechas. Muito parecido com aqueles seres fofinhos e bonitinhos que aparentemente tanto abominava: de meiguice apurada, doçura enfeitiçada, humanidade exagerada.
Acham que o comportamento mostrava isto? Não, nada disso. O slogan era “comigo ninguém se mete, eu é que mando aqui, todos fazem o que quero e ponto final!”. E ai de quem!
Uma total discrepância total entre aquilo que aparentava (comportamento) e aquilo que precisava (necessidade).
E neste processo de enfiar-me na máquina do tempo, respiro, e abro o coração para o meu filho. Para este meu adolescente que está a aprender a crescer.
Este exercício de voltar ao passado ensina-me muito sobre o meu filho. Hoje voltei a ser Carla adolescente, a calçar os seus sapatos, a sentir os seus “desesperos” e foi assim que escrevi uma carta aos meus pais:
Sei que não sou a filha perfeita.
Sei que às vezes faço coisas que não devo.
Sei que salto de uma emoção para outra muito facilmente e vos deixo perdidos na melhor atitude a tomar.
Sei que às vezes é muito difícil acolherem-me porque vos afasto com os meus gritos e bateres de porta.
Sei que não é fácil aceitarem as escolhas que faço: os amigos, as roupas, as manias, …
Sei que não é fácil. Na verdade, nem para mim o é…
Quero ter espaço para ser eu mas não sei quem sou.
Quero expressar o que sinto mas não sei às vezes nem sei o que é.
Parece que sei tudo mas, na verdade, às vezes, não sei nada e sinto-me perdida.
Há uns anos era tudo tão fácil… Era isto ou era aquilo. Agora, entre isto e aquilo, há muitas áreas cinzentas e tudo fica confuso. Depois sinto coisas novas cá dentro que nunca senti…
Falam-me muito do meu futuro. Do que hei-de fazer. Que curso tirar. Que opções tomar. Que relações perpetuar.
Mas o que quero mesmo, mesmo, saber é do que se passa Agora. Agora como lido com as emoções novas que me estão a chegar?
Eu sei que não aparenta mas as vossas palavras contam, os vossos gestos contam, as vossas atitudes contam, por isso, e aqui que ninguém nos ouve, abracem-me quando gritar. O que preciso mesmo, mesmo, mesmo é de saber como lidar com as emoções novas que estão a chegar.
Este regresso ao passado traz-me informações valiosas para saber como lidar de forma calma e serena aos desafios que este meu mestre me coloca.
Desafia-te a viajares até ao sentir do teu adolescente. Talvez desvendes mais facilmente quais são as verdadeiras necessidades do teu filho. O que existe para além do seu comportamento? Opta pelo silêncio e observa. Escava e vai.
Se sentires que te posso ajudar, envia-me um email para carlapatrocinio33@gmail.com.
Um abraço apertado da tua Coach Parental,
Carla Patrocínio